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Captação de água: nordeste brasileiro adapta experiência chinesa
A falta d´água como impedimento para o desenvolvimento rural e de boas condições de vida dos moradores da região semi-árida do noroeste da China está sendo enfrentada através do sistema 1+ 2+1, que capta e armazena a água da chuva em cisternas para abastecer a população em períodos de seca. A região, pobre e ecologicamente frágil, tem algumas semelhanças com o nordeste brasileiro, que está adaptando o sistema, com sucesso, nos municípios de Crateús, no Estado do Ceará, e Cajazeiras, na Paraíba. Os custos acessíveis, a capacidade de produzir resultados imediatos e o nível tecnológico apropriado para uso em grande escala, elementos prioritários também da agricultura familiar nordestina, são características do método chinês. A captação de água da chuva no estado de Gansu (noroeste da China), superando as restrições impostas pela escassez de água que outros modelos não conseguiram, é uma referência. "Os maiores desafios são o financiamento para construção massiva de cisternas e a conscientização da comunidade sobre a viabilidade do processo", afirma João Gnadlinger, técnico do Instituto Regional da Pequena Agropecuária Apropriada (IRPAA), de Juazeiro da Bahia, que passou alguns meses na China visitando a experiência. Ele explica que o programa "1+2+1" é formado por três partes: uma área de captação (100 metros quadrados), duas cisternas de armazenamento d´água (uma para água potável e outra para irrigação) e uma área de terra a ser irrigada (com produção de culturas comercializáveis). O governo chinês dá o cimento para construção de tanques e as famílias contribuem com a areia e a mão-de-obra. A disseminação em larga escala começou em 1995, quando foi priorizado o abastecimento de água potável. Hoje, o programa visa principalmente a irrigação em escala familiar. Nas duas etapas, houve campanhas de conscientização da comunidade. O "1+2+1" resultou no aumento significativo das colheitas de grãos (milho e trigo), frutas (maçã, pêra e pêssego) e da produção de hortaliças em estufa. Foram construídas mais de 2 milhões de cisternas (73,1 milhões de m³ de água), que mataram a sede de 1,3 milhão de pessoas e 1,1 milhão de animais. Mais de 1 milhão de pessoas saíram do estado de pobreza, o que levou outros estados a adotar sistemas similares. O Programa para o Desenvolvimento do Oeste da China prevê, ainda, a construção de terraços em encostas, com 2,5 milhões de cisternas e irrigação de 400 mil hectares. No Brasil, o sistema recebeu o nome de "2+1": dois tipos de água (para uso humano e para a produção) e a terra, e é defendido pelas pastorais das igrejas e por ONGs que há anos trabalham no semi-árido do Nordeste, mas reproduzem os velhos esquemas mentais e políticos de dominação. Para divulgar e implementar essa proposta, estão preparando uma grande campanha de esclarecimento e conscientização em nível nacional. "Afinal, a transposição do rio São Francisco significa solução ou mais um problema? Paliativos como esse não dão sustentabilidade ao Nordeste. Logo, sua implantação, num prazo de mais de 10 anos, vem novamente favorecer o agronegócio, os fins privados, fazendo aumentar o abismo entre ricos e pobres", defende o coordenador da Comissão Pastoral da Terra na Bahia, Ruben Siqueira. Para ele, o programa "2+1" é uma alternativa viável à transposição porque não reproduz o modelo das grandes obras do governo, mas será uma ação economicamente viável e de resultado em curto prazo, que cada família desenvolve com o apoio financeiro do governo. "Se a China, que é mais populosa e tem menos chuvas, convive bem com o semi-árido, nós não conseguimos porque fomos ensinados que o problema da seca não tem solução. Temos mais água que a China, mas não há captação e armazenamento. A indústria da seca transformou o nordestino em massa de manobra dos grandes centros de desenvolvimento, que têm interesse em manter a imagem de região eternamente problemática", opina Siqueira. * Ana Karla Dubiela é jornalista da Adital destacada para cobertura da mobilização social do Programa Fome Zero.
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